O risco que todos corremos

Pe. Geraldo Martins

A curiosidade dos discípulos de Jesus, apresentada por Lucas no evangelho de domingo (Lc 13,22-30) certamente, é compartilhada por muitos de nós, afinal, é grande a curiosidade sobre o número dos que se salvam e, consequentemente, dos que se condenam. Esta, no entanto, não é a preocupação de Jesus. Sem responder diretamente à pergunta que lhe foi dirigida – “Senhor, é verdade que são poucos os que se salvam?” -, ele deixa claras duas coisas. A primeira delas é que a salvação é universal e está ao alcance de todos. A segunda mostra que a condição para entrar no Reino é passar pela porta estreita.

Diante de sua resposta, a pergunta, agora, é outra. O que é a porta estreita? Muitos poderão entendê-la como sendo o sofrimento que acompanha uma pessoa há muito tempo ou os sacrifícios que alguém faz ou mesmo as dificuldades enfrentadas ao longo da vida. Tudo isso pode, sim, caracterizar a porta estreita. Contudo, Jesus parece indicar outra porta estreita.
 
Em Jo 10,7, Jesus afirma: “Eu sou a porta”. Assim, passam pela porta estreita os que se fazem seguidores de Jesus e trilham o mesmo caminho que Ele. A estreiteza da porta não é para dificultar ou impedir a passagem de quem quer que seja. Significa que somente por meio de uma decidida opção se passa por ela. Essa opção implica assumir na própria vida o projeto de Jesus que, muitas vezes, vai na contramão do que propõe a sociedade.
 
Passar pela porta estreita implica, portanto, fazer uma clara opção pelos pobres, como fez Jesus que, sendo rico, tornou-se pobre para nos enriquecer com sua pobreza (cf 1Cor 8,9). Celebrando os 40 anos de Puebla, somo convidados a renovar nossa opção preferencial pelos pobres quando aumenta a desigualdade social alimentada pelo sistema neoliberal que privilegia os que têm e descarta os despossuídos.
 
Não passa pela porta estreita os que ignoram o mandamento do amor que se traduz na entrega serviçal ao outro a partir de sua necessidade. Muitas vezes queremos fazer caridade a partir de nossas medidas e não da necessidade do outro. O verdadeiro amor responde ao que o necessitado precisa. Isso exige nossa conversão diária. É a porta estreita pela qual nem todos passam.
 
A defesa da vida, em todas as suas expressões, também é porta estreita. Rejeita passar por ela os que se mostram indiferentes às constantes agressões que a vida sofre com a fome, a violência, o desemprego, a falta de moradia, o aborto, a homofobia, a intolerância e tantas outras situações que ferem a dignidade humana. O mesmo se pode dizer quando se ignora o cuidado com a Casa Comum, nossa Mãe Terra. O fogo que toma conta da Amazônia é uma prova do quanto urge a conversão ecológica de que fala o papa Francisco.
 
A busca da justiça e o compromisso com a ética são, igualmente, porta estreita pela qual devem passar todos que sonham sentar-se à mesa do banquete no Reino de Deus. A sentença para quem trilha outro caminho é clara: “afastem-se de mim todos vocês que praticam a injustiça” (Lc 13,27). Afirmar-se cristão não é suficiente para entrar no reino. Assim, compreendemos as palavras de Jesus: “Há últimos que serão primeiros, e primeiros que serão últimos” (Lc 13,30)
 
Neste dia em que lembramos a vocação dos cristãos leigos e leigas, especialmente, das/os catequistas, meditemos no compromisso que todos temos de passar pela porta estreita e na responsabilidade de apontá-la àqueles a quem anunciamos o Evangelho. Deus nos livre da presunção de achar que já pertencemos ao grupo dos salvos para não ouvir de Jesus a sentença: “não sei de onde vocês são” (Lc 13,25). Todos corremos esse risco se não nos tornarmos verdadeiramente discípulos e discípulas de Jesus.

Comentários

  1. Boa noite mano!
    Sua publicação sempre nos faz refletir as nossas ações ... Peçamos a Deus misericórdia!!

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  2. Boa noite!
    Parabéns pela bela reflexão.

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. QUE lindas palavras!!Nos faz pensar nos nossos irmãos que sofrem e vivem à margem da sociedade.Leio e releio todas as reflexões. Sinto como estivesse falando pessoalmente. Mostro todas elas para Marília. Ela disse que reza todos os dias por vc.Estamos com muitas saudades!!!Abraços! !! Magali

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  5. "A estreiteza da porta não é para dificultar ou impedir a passagem de quem quer que seja. Significa que somente por meio de uma decidida opção se passa por ela. Essa opção implica assumir na própria vida o projeto de Jesus...".🌻
    - Que o Mestre sempre nos indique o caminho que leva à porta! Belíssimo texto, mano.
    Um abraço cheio de ternura e saudades.💕

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  6. Excelente texto Padre Geraldo, um grande abraço de todos aqui do jornal O ESPETO, de Passagem de Mariana.

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  7. Lindas palavras . Bela Reflexão. Um abraço.

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