Vigiar, esperar e crer

Pe. Geraldo Martins

O Reino de Deus está no centro da mensagem anunciada por Jesus Cristo e se constitui na grande meta dos que se fazem seus discípulos e discípulas. Ainda que presenciemos fatos e vivamos circunstâncias desafiadoras e adversas ao Reino, não cabe medo, pois Deus cumpre sua promessa de nos dar seu Reino conforme as palavras do próprio Cristo: “Não tenham medo, pequenino rebanho, pois foi do agrado do Pai dar-lhes o Reino” (Lc 12,32).
 
No evangelho deste domingo [(18/8) - Lc 12, 32-48], Jesus indica, em primeiro lugar, que o Reino se alcança a partir da pobreza evangélica, traduzida no despojamento e na partilha. Por isso, determina vender os próprios bens e dar esmola, ajuntando, assim, um tesouro no céu que não é destruído por nada (cf. Lc 12,33). Deixa claro que o coração humano habita o lugar onde estiver seu tesouro (Lc 12,34). Um alerta para todos nós que somos, insistente e permanentemente, tentados pelo consumismo que alimenta o insaciável sistema capitalista que governa o mundo.
 
Junto com a pobreza, Jesus indica a vigilância como caminho para se chegar ao Reino. Não uma vigilância passiva, descomprometida, indiferente, mas vivida no compromisso com a justiça, com a solidariedade e com a paz. Por isso, orienta: “Fiquem cingidos, em prontidão, com as velas acesas” (Lc 12,35). Isso significa vigiar, aguardando a passagem do Senhor que vem para nos libertar de todo mal.
 
Exemplo de vigilância é o povo de Deus, escravo no Egito, que passou a noite em vigília aguardando a passagem do Deus libertador, conforme vimos no livro da Sabedoria (Sb 18,6-9). A “noite da salvação” foi acolhida pelo povo de Deus como “salvação para os justos, mas também como extermínio para os injustos” (Sb 18,7). Palavra de consolo para os que conseguem enxergar a “noite escura” pela qual passamos quando voltamos nosso olhar para a realidade política, social, econômica e cultural do Brasil.
 
Caracterizaram essa ‘noite escura”, entre outras coisas, a iminente perda de direitos que se vislumbra com a reforma da Previdência, com as reformas da educação; o clima belicoso e revanchista que toma conta das redes sociais e das relações humanas por conta, em grande medida, do discurso de quem dirige o país; a intolerância e o discurso de ódio presentes em muitos grupos e pessoas que não sabem conviver com as diferenças; a desconfiança generalizada por causa dos vazamentos que colocam em suspeita a Lava Jato e, consequentemente, o combate à corrupção; a resistência de muitos ao sínodo para a Amazônia; a violência que ceifa vidas e dissemina insegurança; o desemprego; o desrespeito com a natureza e o meio ambiente; a insensibilidade para com as causas dos mais pobres e vulneráveis como os povos tradicionais, população em situação de rua, imigrantes.
 
Sem uma vigilância operante, não veremos a libertação que Deus, em seu filho Jesus, continua a nos oferecer. Tal vigilância é alimentada pela esperança e pela fé, como nos ensina a carta aos Hebreus: “A fé é um modo de possuir o que ainda se espera” (Hb 11,1 – segunda leitura). De fato, como vigiar se não há esperança? Aliás, ninguém pode dizer que é cristão se não tem esperança. Nossa esperança nasce da cruz de Cristo, na qual Ele morreu para ressuscitar, provando que o mal não tem a última palavra. No coração do cristão, portanto, não há espaço para derrotismo, ainda que a situação seja desanimadora. Miremos no exemplo de Abraão que guiou toda sua vida pela fé (cf. Hb 11,8) e soube “esperar contra toda esperança” (Rm 4,18).
 
A Palavra de Deus nos provoca a buscar o Reino de Deus a partir destas ações que se interpenetram: vigiar, esperar e acreditar. Sejam essas ações nossa identidade cristã no esforço de vivermos nossa vocação e de construirmos nosso tesouro no céu, onde ladrão não chega nem traça corrói, afinal, onde estiver nosso tesouro, aí estará nosso coração (cf. Lc 12,33s).

Comentários

  1. Grande verdade em tão poucas palavras!
    Que o Senhor Deus abençoe nosso país e o mundo todo!!🙌🙌

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  2. Que sejamos fortes o bastante para não esquecermos esta lição. Que nosso coração viage para onde Deus mandar .
    Parabéns mano. Texto perfeito e muito real.

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  3. Primo querido! Sábias palavras. Obrigada por partilhar conosco.

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. "...vigiar, esperar e acreditar. Sejam essas ações nossa identidade cristã". Um beijo, mano querido! Muitas saudades. <3

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