Setenário das Dores de Maria V

5ª Dor – Maria aos pés da Cruz

Pe. Geraldo Martins

“Junto à cruz de Jesus estavam de pé sua mãe e a irmã de sua mãe, Maria de Cléofas, e Maria Madalena. Jesus, ao pver sua mãe e, ao lado dela, o discípulo que ele amava, disse à mãe: ‘Mulher, eis o teu filho!’. Depois disse ao discípulo: ‘Eis a tua mãe!’” (Jo 19,25-26).

   
 A crucifixão de Jesus, a um só tempo, esconde e revela os mistérios insondáveis de Deus. Esconde na medida em que nos deixa intrigados com a forma escolhida por Deus para manifestar a extremidade de seu amor pela humanidade, entregando seu Filho à morte. Revela porque, por meio da cruz, instrumento da morte de Jesus, Deus oferece a salvação a toda a humanidade. Diante da cruz de Cristo, ganha sentido a palavra do Senhor por meio do profeta Isaías: “Os meus pensamentos não são os vossos pensamentos, e vossos caminhos não são os meus caminhos” (Is 55,8).

     De todas as criaturas, Maria foi quem melhor compreendeu e viveu esses mistérios divinos. Não só porque presenciou tudo, mas porque se associou à dolorosa paixão de seu filho querido. Esse é o significado de sua presença junto à cruz de Jesus. E o evangelista João faz questão de afirmar que ela estava de pé para significar a plena confiança nos desígnios do Pai. Ela não esmorece com a dor.

     A quinta dor de Maria soa-me como a síntese de todo o seu sofrimento, sobressaindo-se em relação às outras seis dores pelas quais passou. Afinal, nada pode doer mais no coração de uma mãe que assistir ao assassinato do próprio filho, inocente e santo. 

     É preciso ter em conta que a cruz se destinava aos bandidos, aos escravos revoltosos, aos ladrões, tanto é verdade que havia dois ladrões sendo crucificados com Jesus. Segundo Renold Blank, aquele que era crucificado “tornava-se um ‘não-pessoa’ aos olhos de seus contemporâneos, sobre a qual era impossível falar. Um crucificado tinha que ser extraído da memória do povo e esquecido por todos. Era este o veredicto que pairava na cruz” . Compreendemos, assim, porque esta é a dor mais profunda de Maria.

    Como que para alentar sua mãe, Jesus, pouco antes de morrer, lhe confia a maternidade de toda a humanidade – ‘mulher eis o teu filho”. No coração da humanidade – “filho, eis tua mãe” - Maria encontrará abrigo e proteção, hoje, manifestos no carinho e na devoção que o povo lhe dedica.

     Queridos irmãos e irmãs, a dor sentida por Maria aos pés da cruz remete-nos às dores das mães que veem seus filhos jovens condenados à morte pelo narcotráfico, pela depressão, pela ilusão das riquezas, pela busca do prazer pelo prazer. É a dor dos povos indígenas e trabalhadores rurais que veem suas lideranças assassinadas por defenderem seus direitos. É a dor da Igreja, presente nas comunidades eclesiais, que vê seus missionários e missionárias perseguidos e alguns deles perdendo a vida na defesa da dignidade humana. É a dor de tantas famílias que perdem seus entes queridos por causa do sistema que coloca o lucro acima da pessoa humana, a exemplo do que ocorreu com os crimes da Samarco e da Vale com o rompimento, respectivamente, das barragens de rejeito de Fundão, no município de Mariana, e de Córrego do Feijão, em Brumadinho.

     A dor de Maria na cruz é sentida, hoje, por todos que são vítimas de uma realidade que passa por cima da vida e da dignidade humana como nos lembra o Concílio Vaticano II: “Tudo quanto se opõe à vida, como seja toda a espécie de homicídio, genocídio, aborto, eutanásia e suicídio voluntário; tudo o que viola a integridade da pessoa humana, como as mutilações, os tormentos corporais e mentais e as tentativas para violentar as próprias consciências; tudo quanto ofende a dignidade da pessoa humana, como as condições de vida infra-humanas, as prisões arbitrárias, as deportações, a escravidão, a prostituição, o comércio de mulheres e jovens; e também as condições degradantes de trabalho; em que os operários são tratados como meros instrumentos de lucro e não como pessoas livres e responsáveis. Todas estas coisas e outras semelhantes são infamantes; ao mesmo tempo que corrompem a civilização humana, desonram mais aqueles que assim procedem, do que os que padecem injustamente; e ofendem gravemente a honra devida ao Criador” .

     Consola-nos e fortalece-nos saber que não estamos sós para enfrentar as dores de nosso cotidiano. “Não somos órfãos, temos Mãe: a Mãe Maria. Mas também a Igreja é Mãe e também é ungida Mãe quando faz o mesmo caminho de Jesus e de Maria: o caminho da obediência, o caminho do sofrimento e quando tem o comportamento de continuamente aprender o caminho do Senhor. Estas duas mulheres – Maria e a Igreja – levam adiante a esperança que é Cristo, nos dão Cristo, gerando Cristo em nós. Sem Maria, não existiria Jesus Cristo; sem a Igreja, não poderemos andar adiante”.

     Sendo assim, a ela podemos recorre confiantes:
Ó Maria, Virgem fiel, nós vos saudamos, pois avançastes em peregrinação de fé e mantivestes fielmente vossa união com Jesus até a hora extrema de Sua morte. No Calvário sofrestes junto com o vosso amado Filho, com ânimo materno vos associastes ao Seu sacrifício e nos fostes dada como Mãe. Velai Senhora da Piedade, pelos vossos filhos e filhas que sofrem e padecem as consequências do pecado.

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