Setenário das Dores de Maria VI


6ª Dor – Maria recebe o corpo de Jesus

Pe. Geraldo Martins

“José de Arimateia pediu a Pilatos para retirar o corpo de Jesus; ele era discípulo de Jesus às escondidas, por medo dos judeus. Pilatos o permitiu. José veio e retirou o corpo” (Jo 19,38).

Uma das afirmações mais importantes registrada pelo evangelista Marcos foi pronunciada por um soldado romano no momento em que Jesus, crucificado, dá um forte grito e morre. Disse o centurião: “Verdadeiramente este homem era Filho de Deus” (Mc 15,39). A morte na Cruz é o ápice da verdade recusada e combatida por muitos: Jesus é o Filho de Deus.

Nos ouvidos e no coração de Maria, esta palavra não é novidade. Ela sempre soube e acreditou nessa verdade e dedicou toda sua vida a comunicá-la como autêntica missionária. Foi assim, logo após ter concebido e ficado grávida, na visita que fez a Isabel. Foi assim quando deu à luz o seu filho, num estábulo, em Belém. Foi assim quando recebeu a visita dos pastores. Foi assim quando apresentou seu filho ao Senhor, no Templo. Foi assim quando teve que fugir para o Egito a fim de salvar a vida de Jesus e também quando, sem perceber, o deixou no Templo, entre os doutores, após a festa da páscoa. Foi assim quando intercedeu pelos noivos nas Bodas de Caná orientando os mordomos que fizessem tudo que seu filho mandasse. Foi assim quando procurou Jesus no momento em que estava em missão. Foi assim em tantos outros momentos que os Evangelhos não registraram.

O corpo deste homem, que “verdadeiramente era Filho de Deus”, está agora sem vida, sem movimento, inerte. Quem o desejará? Para que o desejará? José de Arimateia é quem solicita sua retirada da Cruz. Não quer deixá-lo exposto nem à mercê de seus algozes. Dar-lhe uma sepultura digna é o mínimo que se pode fazer em agradecimento e reconhecimento àquele que fez bem todas as coisas (Mc 7,37). Ele “curava os doentes, consolava os aflitos, dava de comer aos famintos, libertava os homens da surdez, da cegueira, da lepra, do demônio e de diversas deficiências físicas; por três vezes, restituiu mesmo a vida aos mortos. Era sensível a toda a espécie de sofrimento humano, tanto do corpo como da alma” (Salvifici doloris, 16).

Todos nós já passamos pela experiência da perda de uma pessoa querida – um familiar, um amigo, um parente muito amado. Um dos gestos mais comuns ao nos despedir daqueles que sepultamos é tocar-lhe o corpo. Não deve ter sido diferente com Jesus. Os poucos amigos que ali ainda estavam, provavelmente, quiseram tocá-lo. Alguns até como forma de pedir perdão por não terem tomado sua defesa durante seu julgamento e condenação.

Sua mãe, no entanto, não se contentaria em apenas tocá-lo. Quisera abraçá-lo pela última vez e embalá-lo como fizera tantas vezes quando era criança. Quem se negaria a atender o desejo de uma mãe? Os Evangelhos não relatam esse momento, porém, não nos impedem de imaginar que teria existido. Impossível acreditar que, retirado da cruz, despido, o corpo de Jesus não tenha sido colocado no colo de sua mãe para que o cobrisse com seu carinho e amor antes do sepultamento.

Com muita frequência chegam-nos notícias de catástrofes e crimes que vitimam de morte um número sem fim de pessoas: soterramentos, enchentes, vulcões, furacões, desastres aéreos, guerras, violências... E pensar que, em muitas dessas situações, são inúmeros os que não tiveram um José de Arimateia para resgatar-lhes os corpos, deixando sua mãe e os demais familiares a esperá-los para o abraço e o carinho da despedida.

Queridos irmãos e irmãs, esta sexta dor da virgem Maria nos leva a refletir sobre a dignidade do corpo humano que, embora seja matéria corruptível, merece todo respeito, não só em vida, mas também após a morte. Remete-nos ao direito que todo familiar tem de velar e se despedir do corpo da pessoa amada, direito que, às vezes, tem sido negado seja pelas circunstâncias da morte do ente querido, seja por outras razões nem sempre justificadas. Não é exatamente a isso que estamos assistindo nesse tempo da pandemia causada pelo novo coronavírus?

Nossa confiança em Deus é que nos fortalece para superar essas e tantas outras dores que a vida nos reserva. Peçamos à Virgem Maria que venha em auxílio e nos ajude a superar nossos sofrimentos:

Ó Maria, vós que sustentastes nos braços o corpo do vosso Filho acolhei-nos e sustentai-nos quando formos surpreendidos pela dor e pelos sofrimentos. Não permitais que sejamos dominados pelo medo, mas renovai-nos a cada dia na esperança e na fé.


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