Setenário das Dores de Maria IV

4ª Dor: Encontro com Jesus a caminho do calvário

Pe. Geraldo Martins

“Seguia-o uma grande multidão de povo, bem como de mulheres que batiam no peito e choravam por ele” (Lc 23,27).

A piedade popular é uma das riquezas da Igreja e dela herdamos muitos costumes que alimentam a nossa fé e animam nossa caminhada de cristãos no mundo. É o caso desta quarta dor de Maria criada pelo imaginário popular uma vez que não é relatada em nenhum dos evangelhos. Foi o povo, por uma questão lógica, que intuiu o encontro de Maria com seu filho Jesus carregando a cruz para o calvário. De fato, qual mãe, sabendo que seu filho estava sendo julgado e condenado, não abandonaria todos os seus afazeres para dirigir-se ao seu encontro imediatamente? É impossível imaginar que ao grupo de mulheres que seguiam Jesus, batendo no peito e chorando por Ele (cf. Lc 23,27), não viesse se juntar sua querida mãe!

Cada um de nós tem, pois, a liberdade de imaginar a cena desse encontro que nos comove a todos. Proponho um caminho a partir de três personagens: Maria, Jesus e a multidão.

Imagino que Maria tenha tomado conhecimento do que estava ocorrendo com seu filho por meio de amigos ou parentes. Célere, ela vai ao seu encontro. É provável que tenha chegado ofegante e aflita, não, porém, desesperada ou revoltada. Não sei se teve tempo de ligar os fatos. Se sim, seguramente, voltou à sua mente a figura do velho Simeão, no Templo, e compreendeu sua profecia: “Este menino será um sinal de contradição” (Lc 2,34). Eis o prêmio para aquele “que fez bem todas as coisas” (cf. Mc 7,37): a Cruz! Nesse momento, Maria deve ter sentido a espada penetrar-lhe ainda mais agudamente a alma.

A dor de Maria, ao encontrar Jesus com a cruz, era, antes de tudo, uma dor moral, por isso mesmo, mais intensa, mais penetrante. Ver um inocente, que só fez o bem, ser torturado, ridicularizado, abandonado, desfigurado, era por demais doloroso. Que dizer ao filho nesta hora?! São necessárias palavras?! É provável, inclusive, que os guardas nem tenham deixado que ela tocasse em Jesus. Há muitas situações em que as palavras são mesmo desnecessárias. Basta ser presença!

De sua parte, Jesus, ao ver sua mãe, deve ter tido uma mistura de sentimentos. Alegria, por ver a pessoa que mais amava e por quem era mais amado. Tristeza por ser, ainda que involuntariamente, causa de sua dor. Ânimo para continuar sua missão, revigorado pela presença de quem nunca o abandonou nem o desacreditou. A ela falou com seu olhar, com seu rosto desfigurado, com seu corpo chagado, com a cruz sobre a qual iria morrer. 

A multidão foi testemunha privilegiada do maior encontro que a história já registrou. A marca desse encontro é o diálogo silencioso que usa a linguagem do olhar e do coração, própria de quem ama no grau máximo da doação de si. Eis a lição que fica para o mundo perdido em meio a tantos diálogos que destroem e matam ao invés de gerar vida e esperança.

Queridos irmãos e irmãs, esta dor de Maria continua presente quando, encontramos tantos irmãos e irmãs que sofrem por múltiplas razões. Muitas vezes, no entanto, não caminhamos ao seu encontro, mas passamos ao largo, indiferentes, despidos da compaixão. Nessa hora, ecoa em nossos ouvidos a palavra de Jesus: “todas as vezes que vocês não fizeram isso a desses mais pequeninos, foi a mim que não o fizeram” (Mt 25,45). Quem são esses pequeninos? Os famintos, sedentos, estrangeiros, nus, doentes e prisioneiros (cf. Mt 25, 42-43).

Esta dor da virgem Maria nos ajude a progredir na cultura do encontro, lembrados do que disse o papa Francisco: “Hoje vivemos num mundo que se torna cada vez menor, parecendo, por isso mesmo, que deveria ser mais fácil fazer-se próximo uns dos outros. Os progressos dos transportes e das tecnologias de comunicação deixam-nos mais próximos, interligando-nos sempre mais, e a globalização faz-nos mais interdependentes. Todavia, dentro da humanidade, permanecem divisões, e às vezes muito acentuadas. Em nível global, vemos a distância escandalosa que existe entre o luxo dos mais ricos e a miséria dos mais pobres. Frequentemente, basta passar pelas estradas de uma cidade para ver o contraste entre os que vivem nas calçadas e as luzes brilhantes das lojas. Estamos já tão habituados a tudo isso que nem nos impressiona. O mundo sofre de múltiplas formas de exclusão, marginalização e pobreza, como também de conflitos para os quais convergem causas econômicas, políticas, ideológicas e até mesmo, infelizmente, religiosas” (Mensagem para o Dia Mundial das Comunicações - 2014).

A Senhora das Dores nos dê a capacidade de olhar e amar “os mais pequeninos” do mesmo jeito que ela olhou e amou seu filho desfigurado a caminho do Calvário. Seja nossa presença, junto aos sofredores, alento e força na sua caminhada rumo à libertação que Jesus nos alcançou com sua morte e ressurreição. 

Contando com o auxílio da mãe dolorosa, imploramos: 
Ó Maria, fostes presença em todos os momentos da vida de vosso Filho, também no caminho do Calvário, acompanhai também vossos filhos e filhas que trilham a via da dor e do sofrimento. Como fostes ao encontro de Jesus, que carregava a cruz, vinde ao encontro de todos que suplicam vosso auxílio para acompanhar vosso Filho como seus discípulos e discípulas.

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