A Palavra se faz vida - 8º DTC

A BOCA FALA DAQUILO QUE O CORAÇÃO ESTÁ CHEIO

 8º Domingo do Tempo Comum - Ano C

Eclo 27,5-8 (gr.4-7); Sl 91,2-3.13-14.15-16; 1Cor 15,54-58; Lc 6,39-45

  

No final de seu discurso às multidões na planície, Jesus dá orientações que se aplicam, especialmente, àqueles que exercem alguma liderança na comunidade, constituindo-se como guias do povo. Não pode ser guia do outro quem vive na escuridão, daí a advertência de Jesus: “Pode um cego guiar outro cego? Não cairão os dois num buraco?” (Lc 6,39). Quem, portanto, não tem a luz que vem da fé e da Palavra de Deus, não está apto a se apresentar como guia da comunidade.

No exercício de sua missão, o guia precisa estar atento a três tentações, segundo o evangelho de Lucas. A primeira delas é a de querer equiparar-se ao mestre. O guia é sempre discípulo e não pode querer tomar o lugar do mestre ou colocar-se acima dele. No contexto atual, não é difícil encontrar discípulo que se apresenta como mestre. As redes sociais estão cheias deles. Fiquemos atentos!

Em segundo lugar, Jesus mostra que o verdadeiro guia tem consciência de suas faltas e jamais se coloca acima dos outros. Faz lembrar aquela admoestação de São Paulo aos Filipenses: “Não façam nada por ambição ou vanglória, mas, com humildade, cada um considere os outros como superiores a si” (Fl 2,3). Não cumpre bem sua missão a liderança que se despe da humildade e se sobrepõe aos que ele deve guiar. Quantos de nós somos rápidos para ver o cisco no olho de nossos irmãos e lentos para admitir a trave que trazemos em nossos próprios olhos. Quem assim age, deixa-se guiar pela presunção e pela autossuficiência. E ninguém pode guiar o outro com esses predicados.

Finalmente, Jesus destaca o coração como o lugar que abriga os verdadeiros sentimentos do ser humano. Se o coração é bom, todas as ações da pessoa refletirão essa bondade, afinal, “a boca fala do que o coração está cheio” (Lc 6,45). O verdadeiro guia cuida, antes de tudo, do próprio coração a fim de que sua fala tenha a autoridade que nasce da verdade de seu interior.

Esta palavra do evangelho joga luz e nos faz compreender melhor o texto de Eclesiástico proclamado na primeira leitura da liturgia deste 8º Domingo do Tempo Comum. Com o objetivo preservar os valores morais e éticos e a tradição religiosa do povo, ameaçados pela cultura helênica, o autor destaca que o ser humano é avaliado pelo que diz. Usando a imagem da peneira, do forno que queima o vaso do oleiro e da árvore, que é conhecida por seus frutos, o autor sagrado aponta para a necessidade de não nos deixarmos impressionar pela exterioridade. No caminho para o Reino, o que conta é o interior, aquilo que nasce de dentro, afinal, “é no falar que o homem se revela” (Eclo 27,8). Jesus diz a mesma coisa com outras palavras: “O homem bom tira coisas boas do bom tesouro do seu coração. Mas o homem mau tira coisas más do seu mau tesouro, pois sua boca fala do que o coração está cheio” (Lc 6,45).

Vivemos tempos difíceis, em que muitas lideranças servem-se do poder para oprimir e explorar. Incapazes de se colocar no lugar dos que vivem situações de vulnerabilidade, passam longe desta exortação de Jesus às lideranças de sua época e reproduzem, no hoje de nossa história, os mesmos males que ameaçavam a vida do povo no tempo de Jesus. Incluem-se aqui lideranças políticas, empresariais, religiosas e tantas outras que, em qualquer âmbito, deveriam se guiar pelo amor, pela compaixão, pela ternura, pela solidariedade. A invasão da Rússia à Ucrânia é um exemplo do que pode acontecer quando um líder tem o coração vazio de coisas boas...

O apóstolo Paulo, na segunda leitura da liturgia de hoje, encerrando seu ensinamento sobre a ressurreição, afirma que a morte não terá a palavra final. Por isso, devemos ser firmes e inabaláveis, cada vez mais empenhados nas obras do Senhor, lembrados de que nossas fadigas não serão em vão (cf 1Cor 15,58).

Seja esta a grande motivação a nos fazer trilhar o caminho proposto por Jesus: a humildade e a bondade que brotam de nosso interior. Agindo assim, reuniremos as credenciais que nos identificam como seus discípulos e discípulas, prontos para ajudar os que desejam experimentar as alegrias do Reino.

Comentários

  1. Muito obrigada, Pe. Geraldo, pela bela e pertinente reflexão.

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  2. Outra vez apreciei bem sua reflexão, Pe. Geraldo.
    Obrigado!
    D. Francisco Merkel CSSp

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