“Falavam de seu êxodo que se consumaria em Jerusalém” (Lc 9,31)
Gn 15,5-12 17-18; Sl 26,1.7-8.9abc.13.14; Fl 3,17-4,1; Lc 9,28b-36
Diferentemente dos outros evangelistas, Lucas acentua que
Jesus subira a montanha para rezar. Não diz que ele se transfigurou, mas que “seu
rosto mudou de aparência e sua roupa ficou muito branca e brilhante” (Lc 5,29).
E isso ocorre enquanto rezava. É nesse momento que “a glória de Deus o invadiu,
transparecendo até do lado de fora” (Papa Francisco, 17.03.2019). A transfiguração
de Jesus mostra-nos, então, a força transformadora da oração.
A palavra-chave, no entanto, nesta cena da transfiguração,
segundo São Lucas, parece ser o conteúdo da conversa de Jesus com Moisés e
Elias, símbolo da Lei e dos Profetas. Eles “falavam sobre o êxodo de Jesus que
se consumaria em Jerusalém” (Lc 9,31). Discutiam, portanto, sobre a morte e
ressurreição de Jesus, o êxodo definitivo da libertação de toda humanidade.
Assim, comenta o Papa Francisco, “a transfiguração de Cristo
indica-nos a perspectiva cristã do sofrimento. O sofrimento não é
sadomasoquismo: ele é uma passagem necessária, mas transitória. O ponto de
chegada para o qual somos chamados é luminoso como o rosto de Cristo
transfigurado: n’Ele encontram-se a salvação, a bem-aventurança, a luz, o amor
ilimitado de Deus. Mostrando assim a sua glória, Jesus assegura-nos que a cruz,
as provações e as dificuldades com as quais nos debatemos têm a sua solução e
superação na Páscoa” (Papa Francisco, 17.03.2022).
Os três discípulos, no entanto, dormiam e, quando acordam,
veem a glória de Jesus. Ficam fascinados e sem palavras diante desse fato
extraordinário. É quando Pedro propõe que sejam feitas três tendas para ali
permanecerem. Não consegue compreender, ainda, que esta glória de Jesus, da
qual todos os seus discípulos são chamados a participar, só é alcançada por
quem faz o caminho da Cruz no seguimento fiel a Jesus Cristo.
A nuvem que os cobre, causando medo nos três discípulos, remete-nos
à nuvem que acompanhou o povo de Deus no deserto (Ex 24,15-18). Traduz a
presença permanente de Deus junto de seu povo. Agora, Deus se faz presente por
meio de seu filho, o Escolhido. É preciso escutá-lo, isto é, aderir com toda determinação
à sua vida e ao seu projeto de libertação.
Não pode ser discípulo de Cristo quem se comporta como
inimigo de sua Cruz (Fl 3,18), conforme ouvimos na Carta de São Paulo aos
Filipenses, segunda leitura proclamada neste domingo. Por meio da Cruz participaremos
da glória de Cristo. Esta nos revela que “somos cidadãos do céu” (Fl 3,20) e, como
Abrão (primeira leitura de hoje), devemos nos deixar guiar pela fé (Gn 15,6) e
fazer o êxodo que nos conduz à Páscoa definitiva, vivendo com fidelidade a
aliança de amor que Deus faz conosco (cf. Gn 15,18).
Subamos a montanha com Jesus. Em atitude de oração, contemplemos sua glória e escutemos o que ele diz. Façamos com que a transfiguração de Jesus seja também a “descoberta do ‘eu profundo’, da própria realidade pessoal e do mistério divino que habita em nós. Nessa manifestação de Deus descobrimos a nós mesmos”[1].
[1] Marcos Mareano. Vida Pastoral, março-abril
2022.
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