“Bendito o Rei, que vem em nome do Senhor!... De fato, este homem era justo!” (Lc 19,38; 23,47)
Lc 19,28-40; Is 50,4-7; Sl 21,8-9.17-18a.19-20.23-24; Fl 2,6-11; Lc 22,14-23,56
A liturgia do Domingo de Ramos, no entanto, pode causar
estranheza a muitos pelo fato de nela se proclamar a Paixão de Jesus. A
explicação é simples. Não se deve confundir o reinado de Jesus com o reinado do
mundo. Jesus não é um rei poderoso, glorioso, revestido do poder político que
domina e explora. Ele não veio para inverter a ordem, ou seja, fazer com que os
dominados passem a dominar ou que os explorados se tornem, agora, os
exploradores. Não! A lógica de Jesus é outra. Seu projeto é de uma fraternidade
universal em que não haja nem explorados nem exploradores, nem oprimidos e nem
opressores.
Jesus é um Rei-Messias que se aniquila a si mesmo,
esvaziando-se de sua condição divina, fazendo-se escravo ao assumir a condição
humana, fazendo-se obediente até a morte na cruz, como lembra a Carta aos
Filipenses (cf. Fl 2,6-7). Ele é o servo sofredor, apresentado pelo profeta
Isaías, que se faz discípulo, ouvindo o Senhor e não fugindo da tortura a que é
exposto por causa da missão. Sua confiança está em Deus, seu auxiliador (cf. Is
50,6-7). Identificado com esse servo, Jesus não se recusa a beber o cálice que
o Pai lhe deu (cf. Lc 22,42).
Alguns aspectos chamam atenção neste relato da paixão de
Jesus como a atitude das autoridades, o comportamento da multidão e a reação de
Jesus. Das autoridades brotam o escárnio, a zombaria, o deboche. Pilatos,
particularmente, traz a marca da covardia por ceder à pressão do povo, que age
incitado por quem está no poder. Com medo de perder o trono, bem ao estilo dos
governantes populistas, Pilatos entrega Jesus à morte, mesmo reconhecendo não
haver nele culpa alguma (cf. Lc 23,22). Sua atitude faz lembrar a justiça,
reclamada pelos inocentes, que nunca chega.
A reação da multidão também é digna de nota. Guiada pelos
chefes dos sacerdotes, pede a condenação de Jesus acusando-o de subverter a
nação e declarar-se o Messias (cf. Lc 23,2). Trata-se de uma acusação tanto
política quanto religiosa. Com esta posição, a multidão defende os interesses
dos poderosos que tudo fazem para permanecer no poder. Não é diferente hoje. Há
muitos que manipulam a população com benesses eleitoreiras e discursos
distorcidos, com sofismas e notícias falsas (fake news), e, assim, se perpetuam
no poder, comandando nações com autoritarismo disfarçado de democracia.
Fixemo-nos, agora, em Jesus e sua postura durante seu
julgamento. Impressiona sua serenidade. Esta nasce de sua confiança no Pai, de
quem procede e cuja vontade cumpre integralmente. O silêncio é sua resposta
mais eloquente aos escárnios e zombarias de que é vítima. “É
impressionante o silêncio de Jesus na sua Paixão. Vence
inclusivamente a tentação de responder, de ser ‘mediático’. Nos momentos de
escuridão e grande tribulação, é preciso ficar calado, ter a coragem de calar,
contanto que seja um calar manso e não rancoroso” (Papa Francisco, 2019).
Mesmo diante da morte injusta iminente, Jesus responde aos
seus algozes com a compaixão que sempre o caracterizou – “Pai, perdoa-lhes.
Eles não sabem o que fazem” (Lc 23,34) - e usa de misericórdia a quem a ele se
confia – “Hoje mesmo você estará comigo no paraíso” (Lc 23,43). Prova, assim,
mais uma vez, ser verdadeiramente o filho de Deus como o atesta o oficial do
exército romano: “De fato, este homem era justo!” (Lc 23,47).
A liturgia deste Domingo de Ramos desperte em nós o desejo e
a coragem de nos colocarmos sempre ao lado dos injustiçados e explorados,
defendendo seus direitos e sua dignidade, tal como nos ensina Jesus, nosso Rei-Messias,
que aceitou morrer na cruz para nossa libertação.
Nesse dia em que se celebra a Jornada Mundial da Juventude, em nível diocesano, os jovens assumam o protagonismo de uma fé libertadora, que leve Jesus às periferias existenciais e geográficas, onde a vida é mais ameaçada. Convidado pelo papa Francisco a “levantar-se” e tornar-se testemunha de Cristo, cada jovem manifeste, nesse dia, sua alegria de se colocar na multidão que segue a Jesus como alguém que o aclama, com a vida e o testemunho, como o Messias libertador.
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