A Palavra se faz vida

Misericórdia: amor visceral

Lc 6,36-38

Por Pe. Geraldo Martins

A misericórdia é o caminho para alcançarmos a santidade a que somos vocacionados. Trata-se de um ideal proposto pelo próprio Cristo aos que se dispõem a segui-lo conforme lemos em São Lucas: “sejam misericordiosos como o Pai de vocês é misericordioso” (6,36), mas também em São Mateus, quando Jesus proclama: “bem-aventurados os misericordiosos porque alcançarão misericórdia” (Mt 5,7).

Segundo Lucas, a prática da misericórdia consiste em não julgar e não condenar, em perdoar e dar, lembrados de que a medida que usamos nessa prática é que revela o quanto somos ou não misericordiosos. “Dar e perdoar é tentar reproduzir na nossa vida um pequeno reflexo da perfeição de Deus, que dá e perdoa superabundantemente”, diz o papa Francisco na Gaudete et Exsultate (n. 81).

A misericórdia nos faz ver o outro como irmão e nos leva a abaixar para servi-lo de acordo com sua carência e necessidade. Implica termos, como Deus, “um coração para os miseráveis” (cardeal Walter Kasper). As obras de misericórdia revelam isso, sejam as corporais - dar de comer aos famintos, dar de beber aos sedentos, vestir os nus, acolher os peregrinos, dar assistência aos enfermos, visitar os presos, enterrar os mortos -; sejam as espirituais - aconselhar os indecisos, ensinar os ignorantes, admoestar os pecadores, consolar os aflitos, perdoar as ofensas, suportar com paciência as pessoas molestas, rezar a Deus pelos vivos e defuntos.

A prática da misericórdia nasce de dentro. Ser misericordiosos, segundo o cardeal Ravasi, “equivale a ser tomados ‘pelas vísceras’, com um amor total, espontâneo, absoluto, até cumprir o gesto extremo de doação, delineado por Jesus no discurso da última tarde de sua vida terrena: ‘ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida por seus amigos’ [Jo 15,13” (A Casa da Misericórdia, p. 38)].

Quem pratica a misericórdia vence a tentação de ser juiz do outro, apontando-lhe os defeitos e julgando-o pelo seu modo de ser. Vive a misericórdia aquele que sabe partilhar, doando ao outro aquilo de que necessita para viver com dignidade; quem perdoa e oferece ao irmão a oportunidade de reconstruir sua vida segundo a bondade de Deus. 

Nossa preparação para a páscoa seja feita neste esforço de viver a misericórdia, que é o amor visceral. Para tanto, coloquemo-nos à escuta da Palavra de Deus a fim de “contemplar a misericórdia de Deus e assumi-la como próprio estilo de vida” (Misericordiae Vultus, 15).

Ó Pai, faz que vivamos a misericórdia amando, perdoando e servindo nossos irmãos e irmãs a exemplo de Jesus. Amém!